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#PERFIS

Chegou a minha mesa como uma suave brisa, talvez fosse mais um dia comum. No ambiente apertado, nas mil pacientes e documentos acumulados, sua presença encandeou. Floresceu. Era fera ferida.

 

- CHEGUEI até você por indicações.

 

O arroxeado ao redor dos olhos e têmporas me explicava a metade do caso. Mas, sua delicadeza, seu perfume, seu modos me desviavam para além mar. Na sua boca um batom nude pouco fazia jus ao lábios bem delineados. Seus olhos de loba fixaram-se aos meus e penetravam-me alma e corpo.

 

Me tragava.

 

As unhas roídas afirmavam um desequilíbrio, como se estivesse em fuga ou houvesse rasgado profundamente almas e corações. Ela era um exemplar a ser notado, raro e imponente.

 

Mas diante a mim, estava completa em sua fragilidade desbotada. Via nela uma personalidade fisgada. Na segunda visita, mostrou-se mais atenta, mais renovada e corajosa.

 

Saiu da toca.

 

Os hematomas e ferimentos eram mais suaves, quase sarados e no rosto um pouco de blush corava-a. O sorriso estava debilitado ainda, era desconfiada. Minha loba sempre na defensiva.

 

Iria sobreviver. Mas como separar sentimentos das sessões? Como podia ser que em tantos anos de profissão e ética, permitiria o aflorar desse sentimento.

 

Agua na boca e sangue nos olhos.

 

Era ela e não eu.

 

Na última sessão, ciente de todos os distúrbios que sofrera, eu estava sofrendo pelo seu impossível alcance. Aquele coração que fora destroçado por outrem, estava são. Porem, as cicatrizes não iriam desaparecer, quer que sejam da alma ou da pele.

 

Era claro que seu batom tomava tonalidades mais vívidas, assim como o calor e gentiliza de seu ser expandiam-se.

 

Ao ser liberada, despediu -se. Liberou meu espírito.

 

Respirei.

 

Disquei.

 

Dane-se requintes de ética.

Perfis - 003

Publicado em 14 de outubro de 2015 por Mylena Rocha

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